LEITURA DE MUNDO, A HERANÇA DE PAULO FREIRE
Neste dia 19 de setembro fazem 91
anos de nascimento do educador Paulo
Freire, falecido em 2 de maio de 1977.
Os que babam azedo ao dizer que a esquerda está superada intelectualmente
conseguiriam enfrentar a lucidez e generosidade humana do educador?
Dificilmente, pois dialético como era, já deve tê-los respondido por
antecipação pelo menos uma centena de vezes. De modo que não nos ocupamos aqui
das cabeças ressentidas, mas de lembrar um dos mais instigantes caminhos
teóricos do educador, o conceito de “leitura de mundo”.
Em 1981, na abertura do Congresso
Brasileiro de Leitura realizado em Campinas, SP, Paulo Freire apresentou o
texto/palestra “A importância do ato de ler”, enunciando sua preocupação com a
compreensão crítica da leitura, que deveria ir além da decodificação simples da
palavra e da linguagem escrita, buscando antecipar-se e alongar-se na inteligência
sobre o mundo. Essa busca, o educador chamou “Leitura do Mundo”.
Para Paulo Freire, a linguagem e a
realidade se prendem dinamicamente e a compreensão crítica do texto implica
percepção de relações entre texto e contexto. Em ambos os casos, respeita-se
que a compreensão e a expressividade são o elemento humano em movimento e não a
dissecação do sistema da língua ou a captura da realidade bruta, sem
inteligência... O raciocínio do educador se harmoniza com o do sociolinguísta
russo Mikhail Bakhtin (1895-1975), para quem o contato entre a significação
lingüística e a realidade concreta se dá nos enunciados da vida, sendo o que
provoca os lampejos da expressividade.
No escrito de 1981, Paulo Freire
sustenta que a Leitura do Mundo é anterior à leitura da palavra, vinda para
cada um da curiosidade, da aculturação e da decifração desde a infância. Em
outro texto, 10 anos depois da palestra no Congresso de Leitura de Campinas, em
diálogo com o físico e pesquisador em educação e antropologia Márcio D´Olne Campos, Paulo Freire pontua que “alfabetização
implica reconhecer o ponto de partida da leitura de mundo, implica pensar em
que níveis a leitura de mundo está se dando ou quais são os níveis de saber que
a leitura de mundo revela”.
Dessas considerações facilmente se
depreende dois erros insistentes do sistema de ensino praticado nas escolas:
abordar a alfabetização e a linguagem pelo formalismo das estruturas
gramaticais - como se a língua fosse petrificada -, e não explorar devidamente
os elos entre o que a criança está aprendendo na escola com o que apreende do
mundo. Tal equívoco – registrou-o Paulo Freire - impede a criança de trilhar em
si mesma o caminho da ingenuidade até a rigorosidade na leitura, enriquecendo a
experiência de ler. Impede também uma aprendizagem aberta à diversidade cultural
e a diversidade expressivo-cognitiva da arte. A leitura de mundo é exercício do
sujeito crítico, artístico e cidadão. É um vasto mundo educativo partindo da
noção deixada por Paulo Freire.
Sugestões de
leitura:
- “A importância do ato de ler”, de Paulo
Freire. Cortez Editora, São Paulo, 2006.
- “Pedagogia dos sonhos possíveis”, de Paulo
Freire. Editora Unesp, São Paulo, 2001.
- “Estética da criação verbal”, de Mikhail
Bakhtin. Editora Martins Fontes, São Paulo, 1997.
Nenhum comentário:
Postar um comentário